STF: SALÁRIO MATERNIDADE NÃO COMPÕE A BASE DE CÁLCULO DA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA PATRONAL

Dhiego de Paula Sales
Advogado

A primeira análise do Supremo Tribunal Federal sobre a natureza jurídica do salário- maternidade para fins de incidência da contribuição devida ao INSS teve início em 28/07/2008, quando o então Min. Joaquim Barbosa reconheceu a repercussão geral sobre a matéria nos autos do RE nº 579.967 (Leading Case – Tema nº 72, STF). No entanto, somente em 06/11/2019, sob a relatoria do Min. Luís Roberto Barroso, a Corte Suprema colocou a matéria em pauta de julgamento. Ao final daquela data, o placar apontava 4 votos a 3 pela inconstitucionalidade da tributação, mas já indicava uma sinalização para mais um voto no sentido da inconstitucionalidade, graças às palavras proferidas pelo Min. Marco Aurélio, que ao pedir vista e suspender a sessão, citou: “é possível conceber-se a contribuição social a cargo do empregador se ele não satisfaz a parcela geradora dessa mesma contribuição social? Já que o ônus é da previdência? O sistema não fecha…”.

Retomando a votação em ambiente de sessão de julgamento virtual na data de 26/06/2020, o Min. Marco Aurélio confirmou seu voto dentro da expectativa prevista, abrindo caminho para a votação dos ministros remanescentes, tendo sido concluída a votação ao final do dia 04/08/2020, com o placar de 7 votos a 4 para declarar a inconstitucionalidade da incidência de contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade – prevista no art. 28, § 2º, da Lei 8.212/1991, e a parte final do seu § 9º, “a”, em que se lê “salvo o salário-maternidade”.

O posicionamento adotado pelo Supremo inova sobremaneira o cenário até então existente, uma vez que o Superior Tribunal de Justiça desde 1999 (REsp 215476/RS) – portanto, há mais de 20 anos – sempre considerou que o salário-maternidade tem natureza salarial e, por isso, integraria a base de cálculo da contribuição previdenciária. Tanto o é que em 26/02/2014, sob o rito dos recursos repetitivos (Tema Repetitivo nº 739, STJ), ao apreciar o Recurso Especial nº 1.230.957/RS, a Primeira Seção, sob a relatoria do Min. Mauro Campbell Marques, encerrou qualquer discussão no âmbito da Corte Superior, na medida em que definiu que incide contribuição previdenciária a cargo da empresa sobre os valores pagos a
título de salário-maternidade.

Alinhados à ideia de que a manutenção da incidência da contribuição previdenciáriasobre o salário-maternidade acaba por aumentar a discriminação entre os gêneros, já que o ônus tributário da maternidade recai inteiramente sobre o empregador, impactando diretamente no aumento do custo da mão-de-obra feminina, comparativamente à masculina; bem como ao fato de que o ônus financeiro do benefício foi transferido legalmente à entidade de assistência social (INSS) desde a edição da Lei nº 6.136/1974; (…) que inexiste habitualidade no pagamento da verba; e, finalmente, que o fato de a verba ser paga por motivo que não corresponde a uma contraprestação pelo trabalho ou a retribuição paga pelo empregado em razão do contrato de trabalho, a declaração de incompatibilidade desta rubrica ao conceito constitucional de “folha de salários” era medida necessária e esperada do STF.

Assim, em nome das garantias constitucionais de proteção à maternidade e ao direitodas mulheres de acesso ao mercado de trabalho, previstas no art. 7º, incisos XIII, XX e XXX, no art. 6º e no art. 5º, inciso I e § 2º, da Constituição da República, é de se ressaltar que a declaração da inconstitucionalidade da referida exação tributária pelo STF representa importante vitória das mulheres no combate à desigualdade de gênero.