RELAÇÕES CONTRATUAIS E OS IMPACTOS DO COVID-19

Com ficam os contratos no atual cenário de pandemia?

O cenário de propagação do Covid-19, declarado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como pandemia, de impacto imensurável e global, enseja instabilidade nas relações jurídicas, em especial nas relações contratuais, na medida em que os reflexos deste evento podem ser impeditivos do adimplemento das obrigaçõesou representar desequilíbriocontratualentre as partes.
Diante deste contexto, surgem questionamentos quanto aos efeitos jurídicos de eventual inexecução contratual, bem como da possibilidade de revisão ou resolução dos instrumentos contratuais celebrados em momentoanterior ao surgimentodo Covid-19 e que por este tenham sido afetados.

No Brasil existe a teoria da imprevisão, a qual dispõe sobre a possibilidade de revisão ou resolução de determinados contratos (onerosos, comutativos e de execução diferida), caso se constate que, após a celebração do negócio jurídico, sobreveio situação que tornou a obrigação contratual excessivamente onerosa para uma das partes, havendo, portantoo desequilíbrio da relação contratual.
Sendo assim, caso a pandemia causou uma desproporcionalidade sobre as obrigações inicialmente pactuadas, a parte prejudicada poderia pleitear a resolução do negócio jurídico, o que poderá ser evitado, caso a parte beneficiada ofereça a revisão dos termos contratuais, com vista à manutenção do contrato e o restabelecimentodo equilíbrio entre as partes.
Ressalta-se que a manutenção da relação jurídica contratual é a medida mais viável para a proteção da estrutura econômica da empresa e do mercado, em observância ao princípio da conservação dos negócios jurídicose da função socialdo contrato.

Todavia, há casos em que não haverá essa desproporção ou ainda que não seja possível ou não se chegue a revisão ou resolução do instrumento contratual e, sendo impossível o cumprimento da obrigação contratualmente prevista, haveria o inadimplemento da obrigação pactuada, o que deverá ensejar consequênciasjurídicas, tais comoa cobrança de encargosmoratórios(juros e multa).
Porém, destaca-se que a propagação do Coronavírus e as medidas para a sua contenção impostas pelo Poder Público, pela sua natureza de evento natural e imprevisível, cujos reflexos econômicos e comerciais não são possíveis prever e/ou evitar, pode ser enquadrada como hipótese de força maior e/ou caso fortuito, sendo que, nesta hipótese, o devedor não seria responsabilizado pelos prejuízos decorrentes deste evento, salvo se este tenha expressamente se responsabilizado.

Assim, se em decorrência do atual cenário não foi possível evitar o inadimplemento contratual, a parte inadimplente poderia invocar a excludente de responsabilidade de força maior e/ou caso fortuito, não respondendo pelosprejuízos.

Isto posto, concluímos que a disseminação do Covid-19 pode ensejar reflexos nas relações contratuais, sendo necessária cautelosa análise dos negócios jurídicos celebrados, de forma a observar os possíveis impactos da pandemia no cumprimento das obrigações, e, sempre que possível, negociar a revisão do contrato, realocando riscos,com o fim de garantir o adimplementocontratual.
Contudo, em último caso, se não for possível a (re)negociação dos termos contratuais e se constate a inexecução contratual, faz-se necessário ainda avaliar a exclusão ou mitigação da responsabilidade pelos prejuízos causados pelo inadimplemento, em razão da excludente de responsabilidade de caso fortuito e/ou força maior.